"Menos, mestre, menos..."

Que o Alto Renascimento é um período absolutamente apaixonante, principalmente no campo das artes, não restam dúvidas!

Dentre os maravilhosos mestres da pintura, Rafael tornou-se um dos meus preferidos. E não é difícil argumentar a seu favor: a suavidade do seu traço e o estilo do contorno são atributos estéticos absolutamente apaixonantes! Não bastassem tais dotes dignos de um grande artesão, o conceito engendrado em torno do seu trabalho torna tudo ainda mais instigante, principalmente para iniciados na História da Arte, como eu.




A "Escola de Atenas" é uma tela de 5,0 m x 7,0 m produzida em afresco (obra sobre parede, com base em gesso ou argamassa, com pigmentos à base de água, cuja técnica é extremamente relevante devido à resistência ao tempo) que se encontra no Palácio Apostólico, no Vaticano.

A "Escola de Atenas" é um dos quatro painéis que procuram retratar diferentes ramos do conhecimento humano. Assim, tais personagens buscam representar a Filosofia, a Poesia (incluindo a música), a Teologia e o Direito. 

Interessado na antiguidade clássica, Rafael fiscalizou a preservação de preciosidades romanas e, apesar de não sabido exatamente o quanto conhecia sobre Filosofia, sua obra é permeada de reflexões que aludem ao tema, conferindo-lhe, inclusive alcunhas tais como as de "humanista" e/ou "pensador neoplatônico".

Existem especulações para identificar as figuras as quais Rafael, supostamente imaginou serem fisicamente semelhantes:


1: Zenão de Cítio ou Zenão de Eleia 2: Epicuro 3: desconhecido (acredita-se ser o próprio Rafael)11 4: Anicius Manlius Severinus Boethius ou Anaximandro ou Empédocles 5: Averroes 6: Pitágoras 7: Alcibíades ou Alexandre, o Grande 8: Antístenes ou Xenofonte 9: Rafael, ou Monalisa,12 13 Fornarina como uma personificação do Amor 14 ou ainda Francesco Maria della Rovere 10: Ésquines ou Xenofonte 11: Parménides 12: Sócrates 13: Heráclito ou Miguelângelo. 14: Platão segurando o Timeu (Leonardo da Vinci). 15: Aristóteles segurando Ética a Nicômaco 16: Diógenes de Sínope 17: Plotino 18: Euclides ou Arquimedes acompanhado de estudantes (Bramante) 19: Estrabão ou Zoroastro (Baldassare Castiglione ou Pietro Bembo). 20: Ptolomeu
R: Apeles (Rafael). 21: Protogenes (Il Sodoma ou Pietro Perugino).


E, apesar de constituírem hipóteses, identidades como as Platão e Aristóteles são inegáveis e não é à toa que este se tornou o fragmento mais famoso de toda a obra. E confesso, quando os meus olhos rodeiam tal ornamento pictórico, a primeira coisa que vem à mente é a máxima "menos, mestre, menos...". Vejamos o porquê.

Aos 61 anos, (aproximadamente uma década após perder o seu mestre, Sócrates) Arístocles  (ou Platão) ainda lecionava na Academia (ou "Escola de Atenas").

Através da "Teoria das Idéias", acreditava que as formas abstratas não-materiais e imutáveis seriam as verdadeiramente reais, em detrimento do mundo material mutável, apreendido através dos sentidos. Os olhos "físicos" não possuiriam a mesma capacidade dos "olhos da alma".

Nesta época, pois, recebe quem viria a se tornar o seu mais famoso aluno, Aristóteles, que saíra de Estagira, aos 17 anos, para estudar em Atenas.

Cerca de vinte anos na Academia permitem Aristóteles arquitetar a base do seu conhecimento e lhe garantem as condições necessárias para formular a sua própria tábula de pensamentos... nem sempre corroborativos com os dos mestre. Para ele a experiência era absolutamente importante e necessária para a aprendizagem do indivíduo. E, neste sentido, chocam-se, uma vez que para Platão o intelecto (ideal) estava em primeiro lugar. 

O filósofo deve sempre preferir a verdade, mesmo quando a tese que combate foi proposta por amigos. Platão é amigo, porém, mais amiga, é a verdade; teria dito Aristóteles.

Platão, portanto, encontra-se apontando para o céu (o mundo das idéias) e Aristóteles, em sentido inverso, como se dissesse "menos... as coisas estão aqui... na nossa realidade!".

Aristóteles não acreditava, ainda na teoria platônica acerca do trabalho poético, segundo a qual, os poetas não produzem em razão de uma técnica (téchne) ou saber (sophia), mas através de um dom natural e de um arrebatamento divino (enthousiasmós) ou de uma possessão ou delírio (manía) cuja causa são as musas. Enquanto Aristóteles, apesar de admitir um possível "dom", afirma na Metafísica que a produção poética envolve o saber e o conhecimento que decorrem de uma série de experiências, apresentando duas possibilidades de: os poetas compõem por arte ou por costume "automático".

E, se o tema agrada e deseja boas referências para aprofundar-se no entendimento acerca de Sócrates, Platão e Aristóteles; assista ao vídeo abaixo, no qual Antonio Joaquim Severino, professor titular, aposentado, de Filosofia da Educação da USP fala um pouquinho mais sobre estes grandes homens e procure ler a referência bibliográfica listada.

Vídeo - ATTA - Filósofos e a Educação - Sócrates, Platão e Aristóteles

Referências:
>> GOMES, Wilson. ESTRATÉGIAS DE PRODUÇÃO DE ENCANTO: O alcance contemporâneo da poética de Aristóteles. UFBA.